Consultor Jurídico

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

LATROCÍNIO - CORRUPÇÃO DE MENORES - PENA EXASPERADA - REDUÇÃO DA REPRIMENDA - DE 13 ANOS E 4 MESES PARA 7 ANOS E 8 MESES


Apelação Criminal Nº 1.0443.17.003201-7/001 - COMARCA DE Nanuque - Apelante(s): PEDRO HENRIQUE GONÇALVES FIGUEIREDO - Apelado(a)(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - Vítima: M.R.C.

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.

DES. FURTADO DE MENDONÇA
Relator.


           

Des. Furtado De Mendonça (RELATOR)

V O T O

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por PEDRO HENRIQUE GONÇALVES FIGUEIREDO, inconformado com a r. sentença de fls. 129/139, que o condenou como incurso nas sanções do art. 157, §3º, in fine, c/c art. 14-II, ambos do Código Penal e art. 244-B do ECA, às penas respectivas de 13 anos e 04 meses de reclusão, além de 07 dias/multa e 01 ano de reclusão. Foi fixado o regime inicialmente fechado.

O apelante foi, ainda, absolvido da prática do crime previsto no art. 157, §2º, I e II, c/c art. 14-II, ambos do Código Penal.

Narra a Denúncia (fls. 02d/03dv) que, no dia 18 de agosto de 2017, por volta de 19h45min, o sentenciado, na garupa da motocicleta guiada pelo adolescente L. H. de J. M., previamente ajustados, compareceu ao posto de combustíveis Serrano, situado na BR 418, no KM 04, na cidade de Serra dos Aimorés, comarca de Nanuque.

No local, “...o denunciado saltou da motocicleta e, com arma de fogo em punho, calibre 44 Winschester, anunciou a intenção delitiva, abordando Marlon Rosa Costa, um dos clientes do posto, exigindo que lhe fosse entregue dinheiro e outros bens, no que foi atendido com o repasse do aparelho celular já mencionado.

Naquele momento, o denunciado, insatisfeito com a negativa da vítima em repassar quantia em dinheiro, apontou a arma para a cabeça de Marlon e acionou o gatilho, tendo o tiro ‘mascado’, o que gerou nova tentativa de disparo, também sem sucesso, o que foi alvo de constatação no laudo pericial de fl. 31...”.

As intimações estão regulares – fls. 140, 141v, 142/142v e 145v.

Em suas razões recursais de fls. 148/135, a i. defesa sustenta a desclassificação para o delito de roubo majorado. Diz que inexistem provas de que o apelante disparou a arma de fogo em direção à vítima. Destaca que o ofendido somente foi inquirido na primeira fase das investigações. Além disso, registra que “...a conduta possível de ser reconhecida como tentativa de roubo com resultado morte é aquela em que a vida é ceifada sem que o agente consiga a subtração objetivada...” – f. 154.

Alternativamente, requer a desclassificação para o delito descrito na primeira parte do §3º do art. 157 do CPB. E, ainda, a redução da pena, em razão do conatus, na fração mediana.

O apelo foi contrariado - fls. 162/179.

Juntado aos autos o parecer do d. Procurador de Justiça Rodrigo Cançado Anaya Rojas – fls. 162/168v.

É o breve relatório.

CONHEÇO DO RECURSO, presentes os pressupostos de admissibilidade e processamento.

Inexistem preliminares.

No mérito.

A materialidade restou consubstanciada no APFD de fls. 02/11, no B. O. de fls. 16/24, além do auto de apreensão de f. 25 e termo de restituição de f. 26. Tudo em sintonia com a prova oral colhida.

A autoria também é inconteste.

O recorrente, reiteradamente, admite a subtração. Diz que, em face de uma dívida que possuía com traficantes locais – que invadiram anteriormente sua residência -, decidiu praticar o roubo para saldar o débito. Então, se deslocou até o posto de combustíveis, na companhia do menor L. H. de J. M., que guiava uma motocicleta. Informa que abordou a vítima e exigiu que esta lhe repassasse quantia em dinheiro, sendo que o ofendido apenas lhe entregou um aparelho de telefonia celular (f. 11 e audiovisual).

O referido telefone foi apreendido pelos policiais militares, após ter sido dispensado pelo recorrente. Destaco:

“...o telefone Moto G5, de cor preta, pertencente à vítima Marlon, foi arrecadado, com o chip da ‘Oi’, porém sem o cartão de memória de 8GB, e sem a capa de proteção; Que quando os autores dispensaram o telefone da vítima, jogando ao chão, o aparelho se abriu, e provavelmente possa ter sumido tais acessórios...” – f. 02v, confirmado em Juízo, em relato audiovisual.

No mesmo sentido é o relato da vítima – fls. 05/05v.

É certa a autoria, pois.

A celeuma reside, na verdade, na classificação do fato. A i. defesa pretende a desclassificação para os crimes previstos no art. 157, §2º ou §3º, primeira parte, do CPB. Sem razão, entretanto.

O recorrente nega que tenha disparado a arma de fogo. Afirma que “...o cano destravou, foi aí que o declarante voltou o encalço, e aí fez o barulho de travar, e a vítima pensou que aquilo foi acionamento do gatilho...” (f. 11). Em Juízo, o réu ainda diz que já adquiriu a arma com a munição percutida.

O ofendido, todavia, é enfático:

“...Pedro Henrique continuou a lhe exigir dinheiro, entretanto, dizia a ele que não tinha nenhum valor, já que abastecia o caminhão através da nota da empresa, o que deixou o ladrão aborrecido, o qual apontando a arma de cano longo para sua cabeça, tentou efetuar um disparo, e o Declarante ouviu o ‘estalo’, e como não conseguiu, o ladrão dobrou o cano onde insere a munição e encalçou novamente, fazendo o barulho ‘trac trac’, e mais uma vez, com a arma apontada para a sua cabeça apertou o gatilho, mas o tiro ‘mascou’...” – f. 05.

A vítima realmente não foi inquirida em Juízo. Mas, os policiais militares Rafael Jesus de Oliveira e Adaildo Alves Nascimento explicam que Marlon Rosa Costa afirmou que o recorrente, diante da negativa deste em lhe entregar valor em dinheiro, acionou a arma de fogo em direção à sua cabeça – fls. 02/03v e 109.

Corroborando a versão do ofendido, os militares registram que a “...Garrucha monótiro, calibre .44, que apresentava um cartucho ‘picotado’...” – f. 02, confirmado f. 109.

No laudo de f. 31 consta: “...44 WCF’ na sua base, com projétil do tipo ogival, sem blindagem e com marcas de tentativas de percussão...”.

A versão do denunciado de que adquiriu a arma de fogo já com o cartucho “picotado” não se sustenta. As provas coligidas realmente indicam que o recorrente, insatisfeito com a negativa do ofendido em lhe entregar valor em dinheiro, acabou por disparar a arma de fogo em direção à cabeça de Marlon Rosa Costa, por duas vezes.

Vejo que a vítima, inclusive, faz menção ao fato do apelante ter dobrado “...o cano onde insere a munição e encalçou novamente, fazendo o barulho ‘trac trac’, e mais uma vez, com a arma apontada para a sua cabeça apertou o gatilho...” - f. 05. Não é mesmo possível que o ofendido tenha se confundido como desejou fazer crer o sentenciado.

A palavra de Marlon Rosa Costa é segura e isenta de qualquer contradição. Não há porque desprezá-la, mormente se restou comprovada pelo relato dos policiais que registram a apreensão da arma de fogo com uma munição “mascada” e pelo resultado pericial.

O acervo probatório aponta, portanto, o animus necandi. 

Assim, não há falar em desclassificação para o tipo previsto no art. 157, §2º, do CPB ou art. 157, §3º, primeira parte, do mesmo diploma.

Certamente, aquele que adentra em um estabelecimento comercial de arma em punho e dispara em direção à vítima, mesmo com a falha do artefato, atua com inegável dolo de matar, assumindo de forma voluntária e consciente o perigo do resultado letal que, apenas não ocorreu por circunstâncias alheias à vontade do agente.

O cenário não favorece o denunciado.

Por fim, é necessário o ajuste do meu entendimento acerca da existência da figura típica do latrocínio tentado. Por diversas vezes já me manifestei contrariamente a isto, nos exatos termos das ponderações defensivas. É que, a meu sentir, trata-se de uma qualificadora – e não, de um tipo autônomo – e que, portanto, só pode incidir se o resultado previsto – óbito - for, de fato, atingido.

Entretanto, resta consolidado o entendimento, nas Instâncias Extraordinárias, que “...sempre que caracterizado o dolo do agente de subtrair o bem pertencente à vítima e o dolo de matá-la, não ocorrido o resultado morte por circunstâncias alheias à sua vontade, há tentativa de latrocínio (REsp 1525956/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 24/11/2015, DJe 07/12/2015). Ainda neste viés,

“Responde por tentativa de latrocínio, na forma do art. 157, § 3º, última figura, c/c o art. 14, II, ambos do CP, quem comete homicídio tentado cumulado com roubo tentado”. (STF - HC - Rel. Maurício Corrêa - RJTACRIM 32/515)

Em razão disto, com olhos postos no princípio da segurança jurídica, hei de me curvar ao entendimento majoritário e adotar tal posicionamento.

Mantenho, portanto, a condenação nos termos lançados na instância a quo.

Quanto às penas, creio que a r. decisão merece reforma.

Na primeira fase, a reprimenda foi definida no mínimo legal: 20 anos de reclusão e 10 dias/multa.

Não há agravantes ou atenuantes.

E, em face do conatus, a reprimenda foi reduzida em 1/3. Aqui, penso que deve ser feito ajuste quanto à fração eleita. Embora tenha havido duas tentativas de disparos, o cartucho “mascou”. A vítima não sofreu qualquer dano físico. Creio, então, que a redução deve ocorrer no maior quantum possível. O crime esteve longe de ser consumado, a meu ver.

Por isso, fixo a pena em 06 anos e 08 meses de reclusão e 03 dias-multa.

Ressalto que não houve qualquer insurgência acerca da prática do delito previsto no art. 244-B do ECA, restando evidenciado que o réu perpetrou o crime contra o patrimônio em coautoria com um adolescente, cuja idade está comprovada pelos documentos acostados aos autos, em especial a cópia da Carteira de Identidade deste – f. 07/08. A sanção foi fixada no mínimo: 01 ano de reclusão.

Foi reconhecido o concurso material entre os delitos. E, apesar de entender que o denunciado, mediante uma só ação, praticou dois crimes, ensejando a incidência da regra do art. 70 do CPB, deixo de fazê-lo. Isto porque, na espécie, não haveria consequência prática, diante da previsão do parágrafo único daquela norma.

Mantenho o regime fechado. O réu perpetrou crime grave, praticado com ameaça e violência. Pedro Henrique Gonçalves tentou disparar sua arma de fogo por duas vezes. Além disso, a prática delitiva restou motivada por dívida com traficantes. O delito ocorreu num posto de combustíveis, onde tinha outras pessoas. Tudo isto indica que o regime mais gravoso é o único suficiente para a reprovação e prevenção da prática delitiva. Inteligência do §3º do art. 33 do CPB.

Ante tais considerações, dou parcial provimento ao recurso, para reduzir a pena, que fica definida, no total, em 07 anos e 08 meses de reclusão, em regime fechado, e 03 dias-multa.

Já foi expedida Carta de Guia à VEC – f. 159. Comunique-se com urgência. 




Des. Jaubert Carneiro Jaques (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
Desa. Denise Pinho Da Costa Val - De acordo com o(a) Relator(a).

SÚMULA: "RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO."