Consultor Jurídico

terça-feira, 9 de junho de 2015

LESÕES CORPORAIS - CARACTERIZAÇÃO LEGÍTIMA DEFESA - RECONHECIMENTO - ABSOLVIÇÃO

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- A existência de fortes indícios de que o acusado agiu amparado em um contexto de legítima defesa impõe o acolhimento do pleito absolutório, em consagração ao princípio favor rei.  Inteligência do artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal.
Apelação Criminal Nº 1.0443.11.004732-3/001 - COMARCA DE Nanuque - 1º Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - 2º Apelante: MOISÉS CONCEIÇÃO SANTOS - Apelado(a)(s): MOISÉS CONCEIÇÃO SANTOS, MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - Vítima: J.C.S.

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar provimento ao segundo apelo. Prejudicado o exame do primeiro apelo.

DES. RENATO MARTINS JACOB
Relator.



           

O Des. Renato Martins Jacob (RELATOR)

V O T O

Em exame, recursos de apelação interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINASGERAIS e por MOISÉS CONCEIÇÃO SANTOS em face da respeitável sentença de fls. 88/91 que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal para condenar o segundo apelante nas sanções do artigo 129, §1º, inciso I, do Código Penal, fixando-lhe a pena de 01 (um) ano de reclusão, em regime aberto, a qual foi suspensa na forma do artigo 77 do mesmo diploma legal.
Foi concedido ao acusado o direito de recorrer em liberdade.
Nas razões de fls. 97/98-v, o ilustre Promotor de Justiça pugna pela condenação do acusado nos exatos termos da denúncia, ou seja, pelo crime de lesão corporal na modalidade gravíssima (artigo 129, §1º, II, do CP), argumentando para tanto que o exame de corpo de delito trouxe elementos que demonstraram a deformidade permanente causada pela lesão.
A Defesa, por sua vez, pleiteia a absolvição, com fulcro na tese de configuração da excludente de legítima defesa. Alternativamente, postula a desclassificação do delito para modalidade culposa, sob o argumento de que o acusado não tinha a intenção de lesionar a vítima (fls. 114/115)
Em sede de contrarrazões, às fls. 100/101 e fls. 117/119, o Ministério Público e Moisés pugnaram, respectivamente, pelo desprovimento do recurso da parte ex adversa.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se às fls. 121/126, opinando pelo provimento do recurso defensivo, e, caso não seja este o entendimento da Turma Julgadora, pelo provimento do recurso ministerial.
Esse, resumidamente, é o relatório.
Não há preliminares e nem se vislumbram nulidades a serem apreciadas de ofício.
Por uma questão de prejudicialidade, analisarei primeiramente o recurso defensivo.
O apelante foi condenado por infração ao artigo 129, §1º, inciso I, do Código Penal, porque, no do dia 18/09/2011, aproximadamente às 09h40min, em um campo de futebol, localizado na Rua Avenida Santos Dumond, na Ilha do Sol, em Nanuque/MG, agindo com vontade de lesionar, agrediu fisicamente J.C.S., causando-lhe as lesões descritas no auto de corpo de delito.
Consta da peça de ingresso que “o denunciado participava de um jogo de futebol juntamente com a vítima e outras pessoas, sendo que em dado momento houve uma discussão entre os participantes do jogo e, na sequência, o denunciado de posse de um pedaço de madeira, desferiu uma paulada no olho da vítima” (fl. 02).
A materialidade delitiva está devidamente positivada no exame de corpo de delito (fls. 17/18) e no laudo de fl. 22, assim como a autoria, já que o próprio acusado assumiu ter efetuado o golpe que lesionou a vítima, embora tenha afirmado que agiu para se defender.
Examinando atentamente os autos, entendo que a pretensão absolutória merece acolhida, por existirem sérios indícios de que o acusado agiu amparado pela excludente de ilicitude da legítima defesa.
O apelante foi bastante coerente nas duas oportunidades em que foi ouvido, narrando que, no dia dos fatos, teve um desentendimento com a vítima em um jogo de futebol, o que desencadeou uma briga entre eles, com a interferência de seus irmãos e dos irmãos daquela. Disse, ainda, que, quando deixava o local, depois que os ânimos já haviam acalmado, os irmãos da vítima vieram em sua direção, tendo, para se defender, arremessado um pedaço de madeira que veio a acertar a vítima (fls. 15 e 74), valendo registrar, ainda, que ele também foi lesionado, conforme faz prova o exame de corpo de delito de fl. 19.
Tal versão foi corroborada por seus irmãos, Renildo Conceição dos Santos e Reginaldo Conceição Santos, os quais confirmaram que o acusado agiu para se defender, em momento posterior àquela briga generalizada ocorrida durante o jogo de futebol, destacando que vítima e seus irmãos deram início às novas agressões:
“Que quando acharam que estava tudo acabado, e já estavam indo embora atravessando uma ponte de madeira, Paulo e Renato, irmãos de Alemão, começaram a jogar pedra, e Moisés pegou um pau e jogou; que o pau pegou em Alemão; que Moisés só revidou, pois foi agredido (...)” (Renildo Conceição dos Santos – fl. 13).

“Que depois que acabou o jogo e passaram da ponte Paulo jogou uma pedra em Moisés e o declarante também revidou com uma pedra, mas não acertou Paulo, que eles vieram correndo atrás do declarante e seus irmãos, que Renato arrumou um porrete e Noises (sic) jogou o pau para trás, acertando Alemão, que a distância era grande e o declarante nem viu que tinha acertado Alemão” (Reginaldo Conceição Santos – fl. 14).

Por outro lado, as declarações judiciais da vítima conferem plausibilidade à versão do acusado.
J.C. confirmou que, depois de cessada a briga, ainda no campo de futebol, houve novo confronto, tendo ido em direção ao acusado, pois resolvera “encarar a briga”, quando, então, foi atingido pelo pedaço de madeira (fl. 71).
É certo que a vítima alegou que assim agiu porque o acusado teria reiniciado as investidas contra si, contudo, creio que tal alegação deve ser recebida com reservas. Ora, nessa situação, o mais comum é que a vítima tente correr e não ir em direção aos seus pretensos agressores, parecendo-me que a vítima e seus irmãos, inconformados com o resultado da briga anterior, decidiram revitalizar a briga ocorrida durante o jogo.
O depoimento Renato Francisco dos Santos, irmão da vítima, também reforça a tese defensiva.
Com efeito, a testemunha apresentou versões conflitantes quanto ao momento em que teria ocorrido a agressão perpetrada pelo acusado. Em um primeiro momento (fl. 10), narrou que as agressões sofridas pela vítima teriam ocorrido naquela briga inicial durante o jogo de futebol. Posteriormente, em juízo, passou a sustentar que a vítima teria sido alvejada após os “ânimos se esfriarem”, mas, nesta oportunidade, mencionou que ele e “seus irmão também estavam armados com pedras e paus; que arremessaram tais objetos em direção a turma do réu, depois que esta já havia arremessado pedras e paus àqueles” (fl. 72).
Enfim, há fortes indícios de que o acusado estava sendo atacado e apenas por isso lançou um pedaço de madeira em direção à vítima, tentando, assim, se livrar de tais agressões.
Nem se alegue que a reação do acusado foi desproporcional, pois também lançavam em sua direção pedras e pedaços de madeira, tendo ele se utilizado do meio que se encontrava disponível e perto dele naquele momento para se defender, não se exigindo, para configuração da mencionada excludente de ilicitude, precisão milimétrica. Fica evidente que a lesão não decorreu de forma premeditada ou por causa de algum entrevero anterior entre acusado e vítima, mas, sim, em razão do momento, como forma de se livrar de uma briga, que, infelizmente, nesse país, é algo muito comum, durante e depois de jogos de futebol.
Ainda que o pedaço de madeira por ele arremessado fosse grande, não me parece possível, no contexto em que se desenvolveram os fatos, pretender que ele quebrasse o pedaço de madeira à metade para depois arremessá-lo. Situação completamente diversa seria se ele tivesse se valido, por exemplo, de uma faca ou de um revólver para arrostar aquelas agressões às quais estavam sendo submetido. Aí sim seria cabível sustentar a desproporcionalidade da reação, o que, contudo, não é a hipótese dos autos.
Embora, ao que tudo indica, quem deu início às agressões tenham sido os irmãos e não propriamente a vítima, tal circunstância não impede o reconhecimento da legítima defesa, pois, em se tratando de lesões perpetradas contra a multidão, é admissível que a reação se dirija de forma indistinta, bastando apenas que a ofensa seja injusta.
Nesse sentido, é a lição de Marcello Jardim Linhares, citado por Guilherme de Souza Nucci:
“Não deixará de ser legítima defesa exercitada contra multidão, conquanto em seu todo orgânico reúna elementos nos quais se possa reconhecer culpa e inocência, isto é, pessoas ativas ao lado de outras inertes (...) não seria culpa dos componentes do grupo que origem à legítima defesa, mas a ofensa injusta, considerada do ponto de vista do atacado. Na multidão, há uma unidade de ação e fim, no meio da infinita variedade de seus movimentos contra uma só alma (Legítima Defesa, p. 166)” (in: Manual de Direito Penal. São Paulo: RT, 2009, 5.ed., p. 265).

Enfim, se não está caracterizada a legítima defesa, no mínimo, existem fortes indícios de que o acusado agiu amparado por tal excludente, o que enseja a absolvição, nos exatos termos do artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal, por força do princípio favor rei, conforme explica Guilherme de Souza Nucci:
 “Se estiver provada a excludente de ilicitude ou de culpabilidade, cabe a absolvição do réu. Por outro lado, caso esteja evidenciada a dúvida razoável, resolve-se esta em benefício do acusado, impondo-se a absolvição (in dubio pro reo). Mas a obviedade nem sempre é tão clara em institutos jurídicos, fomentando a discussão na jurisprudência. A ressalva introduzida, portanto, consagra o princípio do favor rei, deixando consignado que é causa de absolvição tanto a prova certa de que houve alguma das excludentes mencionadas no inciso Vi, como também se alguma delas estiver apontada nas provas, mas de duvidosa assimilação. Resolve-se a dúvida em favor da absolvição do acusado” (in: Código de Processo Penal Comentado, Rio de Janeiro: Forense, 2014, 13.ed., p. 795).
Mercê de tais considerações, dou provimento ao recurso para absolver MOISÉS CONCEIÇÃO SANTOS, do Código Penal da prática do delito descrito às fls., com espeque no artigo 386, inciso VI, do Estatuto Processual, isentando-o do pagamento das custas processuais, do lançamento de seu nome no rol dos culpados e da suspensão de seus direitos políticos.
Deixo de determinar a expedição de alvará de soltura, porque foi concedido ao acusado o direito de recorrer em liberdade.
Em face da absolvição, resulta prejudicada a análise do apelo ministerial.
Custas pelo Estado.




Des. Nelson Missias De Morais (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Catta Preta - De acordo com o(a) Relator(a).


SÚMULA: "DERAM PROVIMENTO AO SEGUNDO APELO. PREJUDICADO O EXAME DO PRIMEIRO APELO"

ROUBO MAJORADO - QUANTUM DA PENA FIXADA - EXACERBADA - CIRCUNSTANCIA FAVORÁVEIS - DIMINUIÇÃO DA PENA BASE

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EMENTA: EMPREGO DE ARMA DE FOGO - PRESCINDIBILIDADE DE APREENSÃO E PERÍCIA - PROVA TESTEMUNHAL SUFICIENTE. Incumbe à Defesa o ônus de provar a ineficiência ou falta de potencialidade lesiva da arma de fogo, e assim não o fazendo, correta a incidência da causa de aumento prevista no art. 157, § 2º, I, do Código Penal.

V.V.: APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO MAJORADO - AUTORIA E MATERIALIDADE SUFICIENTEMENTE DEMONSTRADAS - DECOTE DA MAJORANTE DO EMPREGO DE ARMA - NECESSIDADE - AUSÊNCIA DE APREENSÃO E PERÍCIA - IMPOSSIBILIDADE DE SE AFERIR A CAPACIDADE VULNERANTE DA ARMA - DOSIMETRIA - AUMENTO EXACERBADO DA PENA-BASE REALIZADO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA - REDUÇÃO IMPOSTA - COMPENSAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA COM A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA - POSSIBILIDADE - PRECEDENTE ORIUNDO DA TERCEIRA SEÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - INFORMATIVO DE JURISPRUDÊNCIA Nº 498 - IMPOSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO DO REGIME PRISIONAL E SUBSTITUIÇÃO DE PENA - ACUSADO REINCIDENTE E PORTADOR DE MAUS ANTECEDENTES - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Não tendo a arma sido apreendida e periciada e inexistindo nos autos meios para se aferir a sua real potencialidade lesiva, necessário o decote da majorante prevista no art. 157, §2º, I do CP, ainda que se tenha notícia de que no crime praticado o agente dela tenha se utilizado para atemorizar a vítima. Após o julgamento do REsp 1.154.752/RS, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que a atenuante da confissão espontânea deve ser compensada com a agravante da reincidência. Só é possível a fixação de regime prisional diverso do fechado ao condenado reincidente na hipótese em que a pena é igual ou inferior a quatro anos e se favoráveis as circunstâncias judiciais. Inteligência da Súmula 269, do Superior Tribunal de Justiça.

Apelação Criminal Nº 1.0443.10.003532-0/001 - COMARCA DE Nanuque - Apelante(s): ALDAIR JOSÉ CASSIANO LISBÔA - Apelado(a)(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - Vítima: SUPERMERCADO ATENDE BEM

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDA PARCIALMENTE A IL. DESª RELATORA.

DESA. LUZIENE MEDEIROS DO NASCIMENTO BARBOSA LIMA (JD CONVOCADA)
Relatora.

 

           


























Desa. Luziene Medeiros Do Nascimento Barbosa Lima (Jd Convocada) (RELATORA)

V O T O

ALDAIR JOSÉ CASSIANO LISBÔA, qualificado nos autos, foi denunciado como incurso nas sanções do art. 157, §2º, I e II (por duas vezes), na forma do art. 70, todos do Código Penal, porquanto, em 24 de abril de 2010, por volta das 18h30min., na Avenida Geraldo Romano, Centro, na cidade de Nanuque/MG, em unidade de desígnios com Jeovane de Oliveira Rodrigues, mediante grave ameaça exercida com emprego de arma, subtraiu para si a quantia de R$10.500,00 do cofre do Supermercado Atende Bem e um aparelho celular de propriedade da vítima Renata Souza de Abreu Lima (fls. 02/05-D).
Concluída a instrução probatória, a i. Juíza sentenciante acolheu os estritos termos da exordial para condenar o acusado por roubo duplamente majorado, a cumprir 08 (oito) anos e 02 (dois) meses de reclusão, em regime fechado, e ao pagamento de 56 (cinquenta e seis) dias-multa, à razão mínima (fls. 74/79).
Inconformada, apelou a defesa do sentenciado (fl. 81). Em razões de fls. 84/88, busca o decote da majorante do emprego de arma de fogo, descontando-se do quantum da pena a fração de 1/3. Requer, ainda, a alteração do regime prisional e a substituição da pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos.
O Órgão Ministerial, em contrarrazões recursais, manifestou-se pela manutenção da sentença recorrida (fls. 101/107).
A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 116/120).
É o breve relatório.
Conheço da apelação interposta, presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.
Inexistentes quaisquer preliminares suscitadas ou nulidades a serem decretadas de ofício.
Consta dos autos que, no dia 24 de abril de 2010, aproximadamente às 18h30min., o ora apelante e seu comparsa bateram às portas do estabelecimento comercial, que já estava fechado, oportunidade em que o gerente do supermercado, Sr. Webert Teles Miranda, acreditando se tratar de cliente, abriu as portas, momento em que foi surpreendido pelos autores que anunciaram o assalto e, mediante grave ameaça, exercida com emprego de arma de fogo, renderam os empregados ainda presentes, obrigando-lhes a abrir o cofre e colocar o dinheiro (aproximadamente R$ 10.500,00) em uma sacola, subtraindo, para si, o numerário em questão. Em seguida, o apelante ainda subtraiu o aparelho celular de propriedade da vítima Renata Souza de Abreu Lima, funcionária do supermercado.
Incontroversas a materialidade e a autoria delitivas, conforme boletim de ocorrência de fls. 08/09 e prova oral coligida (fls. 59/63), sendo o réu confesso quanto ao roubo, busca a defesa do recorrente tão-somente o decote da majorante do uso de arma, a alteração do regime prisional e a substituição da pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos.
Quanto ao pedido de decote da majorante do emprego de arma, vislumbro que, em se tratando de delitos patrimoniais, cuja grave ameaça é exercida com o emprego de arma de fogo, sua apreensão e consequente análise pela perícia são imprescindíveis para a real comprovação de seu potencial ofensivo, não podendo ser supridas pela prova testemunhal.
Neste sentido, ausentes apreensão e perícia que confirme a prestabilidade da arma de fogo, a palavra das testemunhas quanto ao seu emprego será apta a comprovar somente a presença da grave ameaça, necessária à caracterização do roubo.
Eis posicionamento semelhante deste Tribunal:

Se não há prova da apreensão e perícia da arma de fogo, tampouco prova indireta a comprovar sua potencialidade lesiva, necessário o decote da respectiva majorante. (...) (TJMG - Apelação Criminal  1.0672.13.017720-3/001, Relator(a): Des.(a) Nelson Missias de Morais , 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 06/11/2014, publicação da súmula em 17/11/2014)

Não tendo a arma sido apreendida e periciada e inexistindo nos autos meios para se aferir a sua real potencialidade ofensiva à integridade física da vítima, não há como considerar a hipótese de roubo majorado pelo seu emprego, ainda que se tenha notícia de que no crime praticado o agente dela se tenha utilizado para atemorizar a vítima. (...) (TJMG - Apelação Criminal  1.0351.13.002334-1/001, Relator(a): Des.(a) Maria Luíza de Marilac , 3ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 21/10/2014, publicação da súmula em 30/10/2014).

Logo, tenho por bem decotar a referida causa de aumento.
Por outro lado, não havendo dúvida de que o crime foi cometido em concurso de pessoas, uma vez comprovado nos autos que havia outro indivíduo no supermercado, junto do apelante, restou caracterizada a majorante prevista no art. 157, §2º, II do Código Penal, não havendo que se falar no decote da fração de 1/3.
Não obstante, pequenos reparos devem ser procedidos, de ofício, na sentença.
Na primeira fase da dosimetria, e como bem observado pela magistrada de primeiro grau, extrai-se da análise da certidão de antecedentes criminais acostada às fls. 66/68 que o acusado é dotado de maus antecedentes, apresentando uma condenação por tráfico de entorpecentes (0443.11.004854-5) e outras três por roubo consumado (0443.11.004852-9, 0443.12.000465-2 e 0443.10.002184-1), todas elas transitadas em julgado.
Contudo, entendo que o aumento realizado pela douta Juíza foi exacerbado ao considerar que as demais circunstâncias judiciais são favoráveis ao apelante. Desta feita, reduzo o aumento imposto à pena-base de Aldair por conta de seus maus antecedentes, fixando a reprimenda, na primeira fase, em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa.
Outrossim, na segunda fase, a i. Magistrada 'a quo' considerou a preponderância da agravante da reincidência sobre a atenuante da confissão espontânea para acrescer à pena-base do apelante um mês de reclusão.
Todavia, após o julgamento do REsp 1.154.752/RS, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que a referida atenuante deve ser compensada com a agravante. Eis o teor da decisão, publicado no Informativo de Jurisprudência nº 498:

"REINCIDÊNCIA - CONFISSÂO ESPONTÂNEA - COMPENSAÇÃO. A seção, por maioria, entendeu que devem ser compensadas a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência por serem igualmente preponderantes. Segundo se afirmou, a confissão revela o traço da personalidade do agente, indicando o seu arrependimento e o desejo de emenda. Assim, nos termos do art. 67 do Código Penal, o peso entre a confissão - que diz respeito à personalidade do agente - e a reincidência - expressamente prevista no referido artigo como circunstância preponderante - deve ser o mesmo, daí a possibilidade de compensação." (STJ, REsp 1.154.752/RS - Relator: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR - julgados em 23/05/2012).

Assim, compensadas a atenuante da confissão e a agravante da reincidência, na segunda fase de aplicação da pena, fica a sanção do apelante concretizada no patamar fixado na primeira fase, qual seja: 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, e 11 (onze) dias-multa. À míngua de outras causas agravantes ou atenuantes, e incidente, na terceira etapa, a causa especial de aumento prevista no art. 157, §2º, inciso II do Código Penal, recrudesço a reprimenda à razão de 1/3, atingindo esta o patamar de 06 (seis) anos de reclusão e pagamento de 14 (quatorze) dias-multa. Considerando, ainda, o concurso formal de crimes, aumento a sanção imposta, na fração de 1/6, ficando sua pena definitivamente concretizada em 07 (sete) anos de reclusão e pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa.
Noutro giro, os pedidos de modificação do regime prisional e substituição da pena, além de não recomendáveis e inadequados ao contexto fático-probatório, são juridicamente impossíveis no presente caso. Conforme cediço, a reincidência impõe o regime fechado (art. 33, §2º, do Código Penal), quanto mais em se observando os maus antecedentes e a pena superior a quatro anos concretizada ao apelante, nos termos, a contrario sensu, da Súmula nº 269 do Superior Tribunal de Justiça. Da mesma forma, inviável a substituição, seja em função do quantum de pena (superior ao limite legal máximo de quatro anos), seja por se tratar de crime cometido com grave ameaça contra pessoa.
Ante o exposto, CONHEÇO DO RECURSO, E, NO MÉRITO, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, nos termos supradelineados.
Custas ex lege.



Des. Rubens Gabriel Soares (REVISOR)


Compulsando os autos, peço vênia à Eminente Desembargadora Relatora para discordar parcialmente de seu entendimento apenas no que diz respeito ao decote da majorante do emprego de arma de fogo.
Isso porque entendo que incumbe à Defesa o ônus de provar a ineficiência ou falta de potencialidade lesiva da arma de fogo, e assim não o fazendo, correta a incidência da causa de aumento prevista no art. 157, § 2º, I, do CP.
Com efeito, mostra-se desnecessária a apreensão e perícia da arma de fogo para comprovar o seu potencial lesivo, uma vez que tal qualidade integra a própria natureza do artefato. Assim, cabe à Defesa o ônus de provar o contrário, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal.
Nesse sentido, já se posicionou o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL:

"Ementa: HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSUAL PENAL. PACIENTE DENUNCIADO PELO CRIME PREVISTO NO ART. 157, § 2º, I e II, DO CÓDIGO PENAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE PROVAS COLHIDAS EXCLUSIVAMENTE NA FASE INQUISITORIAL. NÃO OCORRÊNCIA. MEDIDA EXCEPCIONAL CUJA PERTINÊNCIA NÃO RESTOU DEMONSTRADA. ROUBO MAJORADO PELO EMPREGO DE ARMA. APREENSÃO E PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DE SEU POTENCIAL OFENSIVO. DESNECESSIDADE. CIRCUNSTÂNCIA QUE PODE SER EVIDENCIADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. JURISPRUDÊNCIA DO STF. RECURSO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. I - Contrariamente ao alegado na inicial, verifica-se, da leitura cuidadosa dos autos, que o juízo de piso não condenou o recorrente com base exclusivamente em prova colhida na fase inquisitorial. II - O trancamento da ação penal, em habeas corpus, constitui medida excepcional que só deve ser aplicada nos casos de manifesta atipicidade da conduta, de presença de causa de extinção da punibilidade do paciente ou de ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas, o que não ocorre na situação sob exame. III - Não se mostra necessária a apreensão e perícia da arma empregada no roubo para comprovar o seu potencial lesivo, visto que essa qualidade integra a própria natureza do artefato. IV - A majorante do art. 157, § 2º, I, do Código Penal pode ser evidenciada por qualquer meio de prova, em especial pela palavra da vítima ou pelo depoimento de testemunha presencial. V - Recurso a que se nega provimento." (STF, RHC 122074, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 20/05/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-109 DIVULG 05-06-2014 PUBLIC 06-06-2014)

No mesmo norte, a orientação do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

"CRIMINAL - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL - ROUBO - EMPREGO DE ARMA - DESNECESSIDADE DE APREENSÃO E REALIZAÇÃO DE PERÍCIA - UTILIZAÇÃO DE OUTROS MEIOS DE PROVA - INCIDÊNCIA DA MAJORANTE - EMBARGOS CONHECIDOS E REJEITADOS. I - Para a caracterização da majorante prevista no art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal, prescinde-se da apreensão e realização de perícia em arma utilizada na prática do crime de roubo, se por outros meios de prova restar evidenciado o seu emprego. Precedentes do STF. II - Os depoimentos do condutor, da vítima, das testemunhas, bem como qualquer meio de captação de imagem, por exemplo, são suficientes para comprovar a utilização de arma na prática delituosa de roubo, sendo desnecessária a apreensão e a realização de perícia para a prova do seu potencial de lesividade e incidência da majorante. III - A exigência de apreensão e perícia da arma usada na prática do roubo para qualificá-lo constitui exigência que não deflui da lei resultando então em exigência ilegal posto ser a arma por si só - desde que demonstrado por qualquer modo a utilização dela - instrumento capaz de qualificar o roubo. IV - Cabe ao imputado demonstrar que a arma é desprovida de potencial lesivo, como na hipótese de utilização de arma de brinquedo, arma defeituosa ou arma incapaz de produzir lesão. V - Embargos conhecidos e rejeitados por maioria" (STJ, REsp 961863/RS, Rel. Ministro Celso Limongi - Rel. p/ Acórdão Ministro Gilson Dipp, Terceira Seção, julgado em 13/12/2010, publicado DJe 06/04/2011).

Nessa linha de raciocínio, desnecessária a apreensão e perícia da arma de fogo para a configuração da referida majorante nos delitos de roubo, se existentes nos autos provas aptas a comprovar o emprego de arma na prática delituosa, como na espécie.
No caso em exame, portanto, correto o reconhecimento e aplicação da majorante descrita no art. 157, § 2º, I, do Código Penal.
Todavia, entendo que, realmente, no caso em comento, a reprimenda merece ser mantida, na terceira fase, tal como operado pela Relatora, eis que a simples existência de duas (02) ou mais majorantes não é o bastante para se determinar exasperação maior do que a mínima estabelecida no § 2º do art. 157 do Código Penal, sendo necessário, para tanto, que haja concorrência de circunstâncias especiais que indiquem a existência de maior periculosidade e poder de intimidação na ação desenvolvida, o que não ocorreu no caso em comento.
Diante do exposto, divirjo parcialmente do voto prolatado pela Eminente Desembargadora, apenas para reconhecer a majorante do emprego de arma (art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal), colocando-me, todavia, de acordo com a reprimenda imposta no voto condutor.


Des. Furtado De Mendonça

De acordo com o Revisor.



quarta-feira, 3 de junho de 2015

Tráfico de Drogas - delitos anteriores - sentença não transitada em julgado - aplicação do §4º do art. 33 da Lei 11.343/06 - possibilidade - substituição pena.

 
     Uma cliente foi condenada a 06 anos de reclusão por tráfico de drogas juntamente com outro cliente. A sentença de primeiro grau foi reformada aplicando-se a pena mínima e substituindo por penas restritivas de direito. A pena ad quo foi exasperada e foi utilizado o fato dos clientes estarem respondendo por outros crimes  sem transito em julgado

Apelação Criminal Nº 1.0443.12.004358-5/001 - COMARCA DE Nanuque - Apelante(s): FERNANDO PEREIRA BARBOSA, RENATA DE OLIVEIRA SANTOS - Apelado(a)(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - Corréu: CLEIDE MENDES DA FONSECA

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO.

DES. ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL
Relator.



           

O SR. Des. Antônio Carlos Cruvinel (RELATOR)

V O T O

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se dos recursos.
Trata-se de recurso interposto em face da sentença de fls. 271/279, que condenou Fernando Pereira Barbosa, nas sanções do artigo 33, caput, da Lei 11.343/06, c/c o artigo 61, I, do Código Penal, às penas de 06 (seis) anos e 05 (cinco) meses de reclusão, em regime fechado, e pagamento de 641 (seiscentos e quarenta e um) dias-multa; e Renata de Oliveira Santos, nas sanções do artigo 33, §1º, da Lei 11.343/06, às penas de 06 (seis) anos de reclusão, em regime semiaberto, e pagamento de 600 (seiscentos) dias-multa, fixados o valor do dia-multa no mínimo, sendo-lhes negada a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
Nas razões de fls. 293/295, requer a apelante Renata a absolvição, ante a ausência de provas acerca da autoria. Já o acusado Fernando, pleiteia a redução das penas para os mínimos, bem como a modificação do regime de cumprimento de pena para o semiaberto.
Narra a denúncia que:

“...Consta dos inclusos autos de inquérito policial que, em 23 de outubro de 2012, por volta das 08h00, na Rua Araguari, nº 196, Bairro Centro, nesta cidade, os denunciados, de forma consciente e voluntária, tinham em depósito, para a venda a terceiros, 08 (oito) buchas de Canabis Sativa L., conhecida vulgarmente como maconha, 01 (uma) pedra de cocaína, conhecida vulgarmente como crack. É dos autos, ainda, que os denunciados, livre e conscientemente, em momento anterior ao descrito, se associaram para o fim de praticar a conduta prevista no artigo 33, caput, da Lei 11.343/06. Segundo restou apurado, nas circunstâncias descritas no item 01, a polícia militar avistou uma usuária de drogas, Adeilza Oliveira Colares, adquirindo entorpecentes na residência da denunciada Renata, momento em que uma equipe se deslocou para o local onde foram apreendidas 08 (oito) buchas de Canabis Sativa L., conhecida vulgarmente como maconha, 01 (uma) pedra de cocaína, conhecida vulgarmente como crack. Consta, por fim que, todos os denunciados utilizavam o imóvel situado na Rua Arahuari, nº 196, Centro, Nanuque/MG, para ali praticarem de forma associada e reiteradamente o crime previsto no artigo 33, caput, da Lei 11.343/06...”

A materialidade restou devidamente comprovada através dos laudos de constatação preliminar (fls. 37/38), e laudo toxicológico definitivo de fls. 57/58.
No tocante à autoria, verifica-se dos autos do processo que a acusada negou a traficância. Assim, as suas palavras devem ser avaliadas em consonância com as outras provas constantes dos autos do processo. Vejamos.
Do interrogatório da acusada Renata de Oliveira Santos, se extrai:

“(...) que a droga apreendida era de Fernando; que por volta de 07:00horas, seu pai lhe deu R$400,00 para pagar o pedreiro; que iria reformar o banheiro; que saiu para beber e percebeu que não estava com a chave; que falou para Cleide para dormirem na casa de Luana; que chegou na casa de Luana e percebeu que Érica estava lá, a qual disse que Luana foi para o Rio de Janeiro; que dormiu na casa e acordou por volta das 08horas da manhã; que ligou para Érica, pois estava trancada na casa de Luana; que dormiu de novo e acordou com os gritos de Fernando, que dizia que a polícia estava invadindo a casa; que Marcos Aurélio apontou a arma para Fernando para que ele abrisse a porta da cozinha; que Fernando colocou a mão no bolso e jogou uma quantidade de maconha e dinheiro dentro de uma vasilha, dentro da pia; que não sabia da existência da droga; que é usuária de drogas; que não usa droga com Cleide; que Cleide é usuária de crack, enquanto que a interroganda é usuária de cocaína; que não costuma comprar drogas, pois sempre há amigos que a emprestam; que em sua defesa alega que, se houve a venda de droga, foi por parte de Fernando; que sua casa já foi ponto de tráfico de drogas, antigamente, que era feito pela mãe da interroganda; (...) que Fernando estava dentro de casa, com a grade trancada; que Fernando não estava do lado de fora, descascando coco; que a grade estava trancada, mas a porta da cozinha não; que Fernando estava com a chave; que acredita que Érica entregou a chave para Fernando, de quem é namorada; que, quando acordou pela primeira vez, estavam só a interroganda e Cleide; que Fernando não dormiu na casa; que o cadeado estava fechado, com Fernando dentro de casa; que Fernando não estava descascando coco; que não se sabe se Érika trouxe a chave; que, depois de conversar com Érica, a interroganda foi dormir e acordou de novo, já com os gritos de Fernando (...)”. (fls. 203/204)

Já o acusado Fernando Pereira Barbosa, alegou em juízo:

“(...) que estava no fundo da casa e chegaram dois policiais pela cerca, que disseram que havia um mandado de prisão contra o interrogando; que o interrogando parou e os policias pularam a cerca; que eles deram uma busca no interrogando e encontraram cinco buchas de maconha no bolso do interrogando; que depois os policiais deram busca na casa; que a droga era para consumo; que não estava traficando no local; que Adeilza estava usando e chegou na casa e pediu uma droga para fumar; que o interrogando deu-lhe uma droga para fumar; que sempre via Adeilza na rua Ubá; que não é amigo dela; que em sua defesa alega que os policiais o espancaram e enforcaram (...)”. (fl. 205)

Por outro lado, o policial militar Marcos Aurélio dos Santos Silva, esclareceu em seu depoimento em juízo:

“(...) que se recorda da prisão dos réus; que o tráfico de drogas foi o motivo de sua prisão; que estavam patrulhando nas imediações, com o soldado Meireles, e avistaram uma mulher na janela da casa, conhecida na polícia por uso de drogas; que a casa é alvo de várias denúncias de tráfico de drogas; que já fizeram uma diligência na residência anteriormente, apreendendo drogas e produtos de furto; que perceberam uma mão entregando algo para a mulher da janela; que abordaram a mulher, que colocou a entrega recebida na boca; que o depoente lhe pediu que cuspisse o objeto e verificou que era droga; que tal mulher confessou que tinha comprado droga naquela residência; que não disse de quem comprou a droga, explicando somente que bateu na janela, pediu e recebeu a droga, pagando cinco reais; que, antes da abordagem, o depoente pediu apoio de outra viatura policial; que retornaram à residência, já com o apoio de outra guarnição, cercando-a; que, enquanto aguardava o apoio, a guarnição do depoente ficava de longe, espionando o que ocorria na casa; que foi só a mulher que compareceu ao local enquanto a guarnição aguardava o apoio; que a depoente e o soldado Rodrigues foram pelos fundos da casa; que o réu, de alcunha “Senegal” estava no fundo da casa, com uma faca, descascando coco; que, ao avistar a viatura policial, gritou “Renata, os homens cercaram a casa! A casa caiu!”; que pularam a cerca e entraram na casa, pois a porta dos fundos estava aberta; que “Senegal” entrou correndo, pegou um dinheiro que estava sobre a mesa e o entregou a Renata, que estava dentro de um quarto; que apreenderam várias buchas de maconha e dinheiro, de cujo valor não se recorda; que na abordagem anterior feita à residência, Renata foi presa por tráfico de drogas; que nem “Senegal” nem Cleide estavam envolvidos naquela oportunidade; que apreenderam giletes; que nenhum dos réus assumiu a propriedade das drogas; que Renata disse ser usuária de drogas; que abordaram a mulher, antes da diligência na casa, entre o Supermercado Macedo e o bar do Paulo; que o depoente afirmou à tal mulher que a tinha visto na janela da casa e que sabia ser um ponto de tráfico de drogas, ao que a mulher confirmou ter comprado droga no local; que acredita que as drogas estavam sobre a pia da cozinha ou sobre a mesa; que o soldado Meireles foi quem localizou a droga; que as drogas estavam acondicionadas em embalagens plásticas; que estava dividida em porções; que antes de pular o muro, o depoente deu ordem de parada a “Senegal”, que não aceitou à ordem e correu para dentro da casa; que de pronto abordou “Senegal” na cozinha, e Renata estava saindo do quarto, quando “Senegal” entregou a ela o dinheiro; que acredita que é uma casa isolada, sem acesso a outras casas; que na realidade são duas casas, sendo uma dividida em dois cômodos; que os cômodos não tem acesso entre si; que cada um tem a sua porta de entrada e saída; que, subindo as escadarias, a casa fica à margem direita; que foi na primeira janela em que houve a entrega da droga; que é a janela da sala da casa; que não se recorda se são duas ou três janelas; que quando o depoente entrou na casa, Cleide estava dentro do quarto com Renata; que “Senegal” é  réu presente em audiência (...)”. (fls. 196/197) (Grifos nossos)

Do mesmo modo, o policial Edvan Rodrigues Pereira, esclareceu em juízo:
           
“(...) que se recorda de ter abordado os réus; que o depoente e seu companheiro de guarnição se deslocaram ao local em apoio à guarnição de Marcos Aurélio, que os acionou para ajudar a cercar a residência; que soube que uma usuária havia sido abordada com droga; que o depoente e o cabo Marcos Aurélio entraram pela cerca da residência; que o réu estava nos fundos, descascando um coco; que Renata estava lá também, sentada; que Marcos Aurélio pulou a cerca, e o depoente o acompanhou; que o réu gritava que a casa havia caído; que foi encontrada maconha na casa, cuja quantidade não se recorda; que Marcos Aurélio e Giliard entraram na casa e realizaram a busca, enquanto o depoente e Sargento Cruz ficaram na varanda com os autuados; que os réus não admitiram a propriedade das drogas; que sabe que o réu havia saído da cadeia há pouco tempo; que ele tinha sido preso com drogas, dias antes; que havia denúncias de que a moça traficava no local; que se refere à ré Luana (apontada como a moça de vermelho – uniforme de presa, se referindo à ré Renata); que mandaram o réu parar, mas ele saiu correndo pela residência; que então Marcos Aurélio pulou o muro; que o soldado Meireles entrou pela porta da frente e abordou o réu; que, assim que pularam conseguiram ver os réus Fernando e Renata, e Cleide estava mais ao fundo da residência; que, subindo a escadaria, a casa fica ao lado direito (...)”. (fl. 198) (Grifos nossos)

Depreende-se dos depoimentos prestados pelos policiais militares que realizada busca na residência onde se encontrava a apelante e o corréu Fernando, lograram apreender 08 (oito) invólucros da droga, conhecida como “maconha”, embaladas e divididas em invólucros plásticos, prontas para a venda.
Ressalta-se que os policiais afirmaram que a residência já era alvo de diversas denúncias anônimas acerca do tráfico de drogas. Salienta-se, ainda, que os policiais militares afirmaram que a testemunha Adeilza Oliveira Colares, confessou perante os policiais militares ter adquirido droga na referida residência.
Assim, a negativa da apelante não encontra respaldo nas demais provas constantes nos autos do processo.
Já se pacificou na jurisprudência que os depoimentos prestados pelos policiais merecem toda credibilidade quando, seguros, coerentes, firmes e corroborados pelas demais provas constantes dos autos.
Nesse sentido:

“O testemunho do policial mesmo participante da diligência do flagrante quando coerente e seguro, é tão valioso como qualquer outro”. (RT 593/423)

Com efeito, o crime de tráfico ilícito de entorpecentes constitui crime de ações múltiplas, e a sua consumação se dá pela prática de qualquer uma das condutas expressas no artigo 33, da Lei 11.343/06, dentre elas a de ter em depósito ou trazer consigo.
Sobre o tema:

"Traficante não é apenas aquele que comercia entorpecentes, mas todo aquele que, de algum modo, participa da produção e na circulação de drogas, como, por exemplo, aquele que as tem em depósito"(TJRS, relator Desembargador Nilo Wolff, Apelação n. 69.100.048-3; JRJRS 151/216 e RF 320/237).

Logo, pelo acervo probatório constante dos autos do processo, não resta a menor dúvida da prática do crime narrado na denúncia (tráfico ilícito de entorpecentes, artigo 33, da Lei 11.343/06), não podendo falar-se em absolvição.
Destarte, compreende-se que a sentença reconheceu corretamente a prática da traficância, não havendo nenhum elemento capaz de elidir a condenação lançada em primeira instância.
De outra banda, verifica-se que a sentença está a merecer reparos.

Do acusado Fernando Oliveira Barbosa.

Quando da dosimetria das penas, o MM. Juiz “a quo” equivocou-se ao fixar as penas-base do apelante, pois as majorou em 06 (seis) meses de reclusão, além dos mínimos previstos, considerando a natureza e a quantidade de droga.
Entretanto, em atenção ao disposto no artigo 42 da Lei 11.343/06, verifica-se que a quantidade de droga apreendida é pequena, sendo 8,50g (oito gramas e cinqüenta centigramas) de “maconha”, contidas em 08 (oito) invólucros plásticos, razão pela qual as penas-base devem ser fixadas nos mínimos.
No que concerne à agravante da reincidência, verifica-se da CAC de fls. 116/117, que o acusado ostenta uma condenação ainda em grau de recurso, ou seja, não transitada em julgado (autos nº 0057753-58.2010.8.13.0043), que não pode servir para configurar a reincidência, tampouco maus antecedentes, razão pela qual tal circunstância deve ser decotada.
Desta feita, passa-se a reestruturação das penas:
Observadas as circunstâncias judiciais na forma da sentença de primeiro grau de jurisdição, e em atenção ao disposto no art.42 da Lei 11.343/06, fixa-se as penas-base em 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa.
Na segunda fase, inexistem circunstâncias agravantes ou atenuantes a serem consideradas.
Inexistem, ainda, causas especiais de aumento de pena também a serem consideradas.
Presente a causa especial de diminuição de penas prevista no §4º, do artigo 33, da Lei 11.343/06, tendo em vista que o apelante é tecnicamente primário e não ostenta maus antecedentes, não havendo informações de que se dedica a atividades criminosas ou que integre alguma organização criminosa, devem as penas intermediárias ser diminuídas em 2/3, concretizando-as em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, e pagamento de 166 (cento sessenta e seis) dias-multa, fixado o dia-multa em seu valor mínimo.

Da acusada Renata de Oliveira Santos

Quando da dosimetria das penas, o MM. Juiz “a quo” equivocou-se ao fixar as penas-base dos apelantes, pois considerou como circunstância desfavorável os maus antecedentes, além da quantidade e natureza da droga, aumentando-as em 01 (um) ano de reclusão, além dos mínimos previstos.
Entretanto, em atenção ao disposto no artigo 42 da Lei 11.343/06, verifica-se que a quantidade de droga apreendida é pequena, sendo 8,50g (oito gramas e cinqüenta centigramas) de “maconha”, contidas em 08 (oito) invólucros plásticos.
Da mesma maneira, verifica-se da CAC de fls. 118/119, que a acusada ostenta uma condenação ainda em grau de recurso, ou seja, não transitada em julgado (autos nº 0057753-58.2010.8.13.0443), não podendo ser utilizada como maus antecedentes, razão pela qual as penas-base devem ser fixadas nos mínimos.
Desta feita, passa-se a reestruturação das penas:
Observadas as circunstâncias judiciais na forma da sentença de primeiro grau de jurisdição, à exceção dos maus antecedentes que aqui fora examinada, e em atenção ao disposto no artigo 42 da Lei 11.343/06, fixa-se as penas-base em 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa.
Na segunda fase, inexistem circunstâncias agravantes ou atenuantes a serem consideradas.
Inexistem, ainda, causas especiais de aumento de pena também a serem consideradas.
Presente a causa especial de diminuição de penas prevista no §4º, do artigo 33, da Lei 11.343/06, tendo em vista que a apelante é tecnicamente primária e não ostenta maus antecedentes, não havendo informações de que se dedica a atividades criminosas ou que integre alguma organização criminosa, devem as penas intermediárias ser diminuídas em 2/3, concretizando-as em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, e pagamento de 166 (cento sessenta e seis) dias-multa, fixado o dia-multa em seu valor mínimo.
Por fim, quanto à possibilidade de fixação do regime aberto de cumprimento de pena, com a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito.
Após o julgamento do Habeas Corpus nº 97.256/10, pelo Supremo Tribunal Federal, decidi rever o meu posicionamento acerca da possibilidade da fixação de regime aberto com a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, ou ainda a concessão do “sursis”, em se tratando do crime de tráfico de drogas.
Com efeito, em referido julgado, fez-se constar como inconstitucionais a expressão “vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos”, constante do artigo 44, da Lei nº 11.343/06, bem como a expressão “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, inserta no § 4º, do artigo 33, da lei 11.343/06.
Do mesmo modo, o STJ, através das decisões proferidas nos HC’s de nºs. 153.924/SP, 98.886/RJ, 172.706/RJ, 191.274/MS, dentre outros, está a conceder a referida benesse aos apenados pelo crime de tráfico de drogas, com a redução operada pelo § 4º, do artigo 33, da lei 11.343/06.
Sendo assim, inexiste óbice, em princípio, à fixação do regime aberto, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em relação ao delito de tráfico de drogas, devendo apenas ser observado se o condenado preenche os requisitos subjetivos e objetivos constantes do artigo 44, do Código Penal.
Nestes termos, observado que os apelantes foram condenados a uma pena de 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, e preenchem os requisitos do artigo 44, I, II e III, do Código Penal, fixa-se o regime aberto e substitui-se as penas privativas de liberdade por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade, e prestação pecuniária no valor equivalente a 01 (um) salário mínimo, a ser revertido para uma entidade assistencial existente na comarca à escolha do Juízo, ficando também a cargo do Juízo da Execução fixar as condições de cumprimento da pena de prestação de serviços à comunidade.
Por fim, se vencedora a decisão, comunique-se “incontinenti ao juízo de primeiro grau de jurisdição para que seja marcada com a máxima urgência a audiência admonitória para fixar as condições de cumprimento da pena de prestação de serviços à comunidade.
Pelo exposto, dá se provimento parcial ao recurso para reduzir as penas fixadas aos apelantes, bem como para modificar o regime de cumprimento de pena para o aberto e substituir as penas privativas de liberdade por restritivas de direitos, nos termos deste voto.
Custas na forma da lei.



Des. Paulo Cézar Dias (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
Desa. Maria Luíza De Marilac - De acordo com o(a) Relator(a).


SÚMULA: "DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO"