Consultor Jurídico

terça-feira, 23 de março de 2021

ABSOLVIÇÃO - AUSÊNCIA DE PROVAS DE AUTORIA - DROGAS ENCONTRADA EM LOCAL DE ACESSO PÚBLICO

 

Autos Nº: 0009274-82.2020.8.13.0443

 Autor: Ministério Público

Réu: Samuel Ferreira de Oliveira

Incidência Penal: Art. 33 ‘caput’, da Lei 11.343/2006

 

SENTENÇA

1. Relatório

Infere-se dos autos que o Ministério Público Estadual apresentou denúncia contra Samuel Ferreira de Oliveira em razão de suposto crime capitulado no artigo 33 ‘caput’, da Lei 11.343/2006. A denúncia foi recebida no dia 19 de novembro de 2020. Na sequência, verifica-se que o processo transcorreu regularmente, tendo o acusado sido citado e apresentado a sua resposta preliminar à acusação.

O feito foi instruído e, na sequência, as partes apresentaram as suas alegações finais em memoriais escritos. Em síntese, é o relatório. Fundamento e sentencio.

2. Fundamentação

Como aponta a prefacial acusatória, no dia 31/08/2018, por volta das 17h48, após receber denúncia anônima, a Polícia Militar, autorizada pelo Sr. Marcos José Antunes Oliveira, proprietário e morador da residência localizada na Av. Geraldo Romano, n. 1.179 do Bairro Stella Matutina, nesta cidade, realizou buscas em sua residência a fim de dar cumprimento a mandado de prisão preventiva expedido contra o acusado Samuel Ferreira de Oliveira.

Durante as diligências, o acusado foi encontrado em um quarto, debaixo da cama. Em um cômodo anexo à casa, foram localizados um moleton e um capacete, dentro do qual os militares acharam 52 (cinquenta e dois) invólucros contendo substância esverdeada, cujo laudo toxicológico preliminar (fl. 14) apontou se tratar de ‘maconha’.

Pois bem. Sem preliminares arguidas, também não infiro irregularidades ou vícios que ensejem a nulidade processual, razão pela qual passo ao conhecimento e enfrentamento do mérito acusatório. Cuida-se de ação penal que imputa ao acusado Samuel Ferreira de Oliveira a conduta de tráfico de drogas, classificada pelo órgão ministerial nos termos do artigo 33, ‘caput’, da Lei 11.343/2006. A materialidade da conduta em tela resta comprovada pelo auto de apreensão à fl. 12 e pelos laudos referentes aos exames toxicológicos acostados às fls. 14 e fls. 33-34. Quanto à autoria, no entanto, os autos não demonstram a mesma convicção. Explico.

 Observa-se que as drogas foram encontradas em um cômodo anexo à casa da testemunha Marcos José, utilizado para depósito dos materiais e instrumentos do seu trabalho como pedreiro. Consoante os seus depoimentos em ambas as fases da persecução penal, a indigitada testemunha afirmou que o referido ambiente é externo à sua casa e não tem cadeado, permanecendo constantemente aberto, o que conduz à lógica conclusão de que o mesmo permanece sem qualquer vigilância ou sistema de segurança a evitar o seu acesso por terceiros. Firme em semelhante premissa, não cabe acolhimento a simplória afirmação de que as drogas localizadas no mencionado cômodo eram de propriedade do acusado, na medida em que o seu acesso era possível a qualquer transeunte.

 Logo, afirmar que a droga pertencia ao acusado, apenas considerando que o cômodo lhe era de livre acesso, como o fez o Ministério Público à fl. 106, revela apenas a rotulação do réu como pessoa marginalizada, premissa sobre a qual se busca a sua condenação.

Veja-se, ainda nesse sentido, que o Ministério Público afirma em suas derradeiras fundamentações (p. 106) que o acusado é “foragido, bem como conhecido no meio policial por envolvimento com o tráfico de drogas”, todavia, sem juntar aos autos sequer uma ocorrência policial nesses termos, a fim de sustentar tais afirmações. Ainda, há que se destacar que a droga foi encontrada dentro de um capacete, embora não haja a mínima informação de que o acusado possui ou se utiliza de alguma motocicleta, ou mesmo se a testemunha Marcos José tinha alguma motocicleta em sua residência.

Percebe-se que semelhante constatação reforça as seguintes convicções: a) o entorpecente em tela pode ter sido guardado no referido ambiente por qualquer pessoa; b) a afirmação da testemunha Marcos José no sentido de apontar a propriedade da droga ao acusado não encontra nenhuma sustentação nas provas colacionadas aos autos; c) o apontamento do moleton localizado no referido ambiente, com a intenção de vincular o acusado a outro crime, notabiliza ainda mais o propósito de etiquetamento da criminalidade ao réu, sobretudo por não haver vinculação alguma com o fato em tela.

Diante do que se infere, não tendo o Ministério Público se desincumbido do seu mister probatório, conforme os termos que lhe impõe o artigo 156 do Código de Processo Penal, de forma suficiente a afastar o estado de inocência assegurado constitucionalmente ao réu e a todos, não cabe o acolhimento da sua pretensão condenatória sem amparo em provas robustas e inequívocas, firmadas apenas nas declarações dos policiais militares que, não obstante dignas, não servem, celibatariamente, à condenação penal.

3. Dispositivo

Diante de todo o exposto, julgo IMPROCEDENTE o pedido formulado pelo Ministério Público na denúncia e, assim, ABSOLVO o acusado Samuel Ferreira de Oliveira pelo crime de Tráfico de Drogas, haja vista que, nos termos do artigo 386, inciso V, do Código de Ritos Penais, não há prova suficiente de ter realizado o crime que lhe é imputado. Assim, determino que se expeça o ALVARÁ DE SOLTURA para imediato cumprimento, DESDE QUE NÃO HAJA OUTRA ORDEM JUDICIAL PARA MANTÊ-LO CUSTODIADO. É como decido. Intimem-se.

CUMPRA-SE.

Nanuque-MG, 19 de março de 2021.