Há alguns juízes que não permitem que o Advogado tenham uma entrevista prévia com o cliente antes de seu interrogatório. Alega o magistrado que se assim for o Advogado poderá instruir o interrogatório do acusado. Não é esse o objetivo de uma entrevista prévia ? Instruir o cliente ? Ademais o acusado tem o direito de conhecer todas as provas antes de se pronunciar.
Abaixo transcrevo parte de um trabalho Juiz Federal Eduardo Francisco de Souza disponível em :
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DIREITO À ENTREVISTA PRÉVIA E RESERVADA
O art. 185, § 5º, do
CPC, estabelece que: “em qualquer modalidade de interrogatório, o juiz garantirá
ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor; se
realizado por videoconferência, fica também garantido o acesso a canais
telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio
e o advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso”. O
direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor já estava previsto
no Decreto n. 678, de 6 de novembro de 1992, que promulgou a Convenção
Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de
novembro de 19697 , e restou melhor delineado pela Lei nº 10.792, de 1º de
dezembro de 2003, que modificou o CPP. Está intimamente ligado à
garantia constitucional da ampla defesa, que exige o oferecimento ao acusado do maior número possível
de meios para sua concretização. Seu surgimento complementa a garantia de que qualquer acusado deve ter
assegurado o acompanhamento de um defensor. A entrevista prévia, que deve ser
assegurada pelo magistrado, também foi instituída em benefício do advogado
(cuja indispensabilidade foi realçada pela Constituição), mormente quando
se trata de acusados
presos, cujo acesso nem sempre é facilitado pelo sistema prisional,
possibilitando ao profissional o cumprimento de seu mister.
A entrevista com o defensor representa ainda a confluência
entre a autodefesa e a defesa técnica, em que esta, exercida pelo defensor,
pode afinar-se com aquela. Com efeito, na conversa reservada com o seu cliente,
o advogado poderá ouvi-lo, elucidar-lhe o teor da acusação e indicar-lhe uma
estratégia de defesa, além de ser uma oportunidade de tranquilizar o acusado,
momento pedagógico para instruí-lo dos seus direitos, mormente o de permanecer
calado, bem como conscientizá-lo de que se eventualmente faltar com a verdade não sofrerá
penalidades por tal conduta.
O direito à entrevista deve ser assegurado, estando na esfera
de liberdade do acusado ou de seu defensor fazer usá-lo, cabendo ao juiz apenas
advertir o acusado da existência de tal direito, não havendo que se falar em determinação de oficio.
Cumpre notar que se tal direito não for assegurado, poderá implicar nulidade do
ato, nulidade esta que se reveste de caráter relavo10. Realmente, a
nulidade só deve ser reconhecida caso comprovado o prejuízo para a defesa, conforme o princípio
pas de nullité sans grief, adotado pelo art. 563 do CPP11, prejuízo que não
ocorrerá, por exemplo, se o acusado permanecer calado durante o interrogatório.
Há certa ponderação na jurisprudência no sentido de que o direito à entrevista prévia e reservada é
vocacionado em especial para o acusado quem tem defensor nomeado pelo juízo,
notadamente quando se encontra preso, sendo no mais das vezes a primeira
oportunidade para conversar com o defensor.
Nesse passo, a garantia deve ser flexibilizada quando se trata de réu
que responde em liberdade e com advogado constuído13, pois quando do interrogatório já travou contato
com seu defensor. Quer dizer, não é que o juiz não deva assegurar-lhe tal
direito; apenas, se eventualmente não formular tal advertência, nessas
condições, não há que se falar em nulidade. O direito à entrevista, inclusive,
tem o condão de sanar vício decorrente de ausência de citação do réu preso14,
que apenas fora requisitado para o interrogatório. Durante o ato, o juiz, ao
esclarecer, mediante a leitura da denúncia, reforçado pela entrevista prévia
com o advogado, supre a falta de citação, cuja finalidade é não apenas integrar
o acusado na relação processual, mas também informa-lhe acerca do conteúdo da
acusação, essencial para que possa exercitar seu direito de defesa. Tal
direito, na dicção da lei, deve ser assegurado qualquer que seja a modalidade
de interrogatório judicial, inclusive aquele que se opera por videoconferência,
tendo a lei se preocupado em garanr “o acesso a canais telefônicos
reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e o
advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso” (art.
185, § 5º, fine, CPC). Submete-se a limites, não sendo reconhecido na fase
policial15 , ante o caráter inquisitivo desta. Operacionaliza-se pela
disponibilização de uma
sala, ou mesmo pela simples retirada do juiz e dos demais da
sala de audiência, ou
através de tecnologia adequada, como a estabelecida por “meio de interfone,
livre de interferência de qualquer agente biológico, ou seja, respeitando-se a
privacidade e sigilo que são inerentes ao exercício da advocacia” 16 . O CPP
determina que “Havendo mais de um acusado, serão interrogados separadamente”
(art. 191), o que deve ser compatibilizado com o direito de entrevista reservada com
o advogado. Tal determinação perderia sentido se o advogado que assistiu o
depoimento do corréu pudesse entrevistar-se com seu cliente que ainda não depôs. A lei fala em
entrevista prévia, mas não diz se prévia ao interrogatório de cada réu ou aos
interrogatórios em geral. A necessidade de se impedir que um acusado presencie
o interrogatório de outro é tão premente que levou EDUARDO ESPÍNOLA FILHO17 ,
em sua clássica obra, a ensinar que: “Entendemos que, a fim de manter-se, com
todo rigor, a finalidade dessa separação, o advogado de um dos co-réus, ainda
não interrogado, não deve ser admitido a assistir o interrogatório dos outros,
pois terá elementos verdadeiramente preciosos para instruí-lo.”
Repare-se que a advertência do provecto professor estaria
mais adequada à época em que não se reconhecia a plenitude do direito ao
silêncio, muito menos a existência do direito de entrevista pessoal, que serve
justamente para possibilitar o réu a instruir o acusado. Nesse passo, o art.
191 do CPP, que trata da inquirição em separado, deveria sofrer uma releitura,
no sendo de que sua teleologia seria apenas para evitar que um acusado fosse influenciado pelo
depoimento do outro18, não sendo vedado o conhecimento do teor do depoimentos
por parte dos demais acusados. Nesse ponto, o caráter de meio de prova, também
inerente ao interrogatório, não pode ser negligenciado, sob o argumento de ser
o interrogatório meio de defesa. É preciso conciliá-los, preservar a vertente
probatória do interrogatório implica reconhecer o caráter histórico que envolve
o processo criminal, e a prova judicial destina-se a hercúlea tarefa, de reconstrução de uma realidade
já passada no tempo. A fim de preservar a atuação do juiz nesse processo de
reconstrução passado, parecenos que é lícito ao legislador erigir meios, tal
como a inquirição separada, que em nada prejudica o direito de defesa do
acusado. Veja-se que a inquirição separada preserva a igualdade das partes,
pois, do contrário, privilegiar-se-ia uma das partes, a que restar a ser ouvida
por último, em detrimento daquela ouvida inicialmente, em arrepio à paridade das armas. É prudente que
o juiz, antes de iniciar os interrogatórios, advirta aos advogados e acusados
que, caso queiram exercer o direito de entrevista, o façam naquele momento, sob
pena de preclusão.
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