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terça-feira, 6 de agosto de 2013

Regime Aberto - Ausência de Vagas - Prisão Domiciliar - Possibilidade - Decisão de 30/07/2013

Número do 1.0024.12.045515-9/001 Númeração 0978559-
Relator: Des.(a) Eduardo Machado
Relator do Acordão: Des.(a) Eduardo Machado
Data do Julgamento: 30/07/2013
Data da Publicação: 02/08/2013
EMENTA: EXECUÇÃO DE PENA - AUSÊNCIA DE VAGA EM
ESTABELECIMENTO PENAL ADEQUADO - CUMPRIMENTO DE PENA EM
REGIME MAIS GRAVOSO - AFRONTA A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
- PRISÃO DOMICILIAR - POSSIBILIDADE - PRECEDENTES DO STJ.
V.V- AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL - REGIME PRISIONAL ABERTO -
PRISÃO DOMICILIAR - IMPOSSIBILIDADE - ARTIGO 117 DA LEP - ROL
TAXATIVO - AUSÊNCIA DE PROVA DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. 1- As
hipóteses de prisão domiciliar, elencadas no artigo 117 da Lei de Execução
Penal, são taxativas e, não se encontrando o sentenciado em nenhuma
dessas hipóteses, impossível a concessão de tal benefício.
AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL Nº 1.0024.12.045515-9/001 - COMARCA
DE BELO HORIZONTE - AGRAVANTE(S): GUSTAVO JOSE GODINHO
RAMOS - AGRAVADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE
MINAS GERAIS
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 5ª CÂMARA CRIMINAL do
Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos
julgamentos, por maioria, em DAR PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO
O DESEMBARGADOR RELATOR.
DES. EDUARDO MACHADO
RELATOR.
DES. EDUARDO MACHADO (RELATOR)
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
V O T O
Trata-se de agravo de execução interposto contra a r. decisão de fl.
40, que indeferiu o benefício da prisão domiciliar ao agravante.
Nas razões recursais, às fls. 04-09, sustenta a defesa, que na
inexistência de estabelecimento penal adequado ao cumprimento da pena no
regime aberto faz-se imperiosa a concessão da prisão domiciliar ao
agravante.
Contrarrazões recursais, às fls. 11-16.
Juízo de retratação, em fl. 17.
Manifesta-se a douta Procuradoria de Justiça, às fls. 32-36, pelo
conhecimento e desprovimento do recurso.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Apura-se dos autos que o réu encontra-se cumprindo pena pelo delito
de roubo tentado, em regime aberto.
Em que pesem as ponderações da defesa, não vislumbrei a
possibilidade de modificação da decisão hostilizada.
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
O artigo 117 da Lei de Execuções Penais é taxativo e estabelece as
únicas hipóteses em que é permitido o cumprimento de pena em regime
aberto, em residência particular. As situações são as seguintes:
a) condenado maior de 70 anos;
b) condenado acometido de doença grave;
c) condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; e
d) condenada gestante.
Sobre o tema, leciona Júlio Fabbrini Mirabete (Execução Penal, 2002,
p. 430):
"A destinação do condenado em regime aberto à residência
particular sem que haja qualquer controle ou fiscalização por parte da
administração, como tem ocorrido, significa a total impunidade pelo crime
praticado. A circunstância de, eventualmente, não existir na Comarca a Casa
do Albergado não quer dizer que o Estado deve deixar de executar a pena
privativa de liberdade regularmente aplicada. A prisão aberta é apenas um
regime de pena e, na falta de instalações adequadas ao seu cumprimento,
como solução provisória, o condenado deve ser recolhido à cadeia pública ou
outro presídio comum, em local adequado, e não deixado em inteira
liberdade. A prisão albergue domiciliar só é cabível nas hipóteses do art. 117
da Lei de Execução Penal. (...)".
Não obstante, é possível observar que, na espécie, o agravante não
preenche nenhuma das hipóteses elencadas no art. 117 da LEP, não
havendo que se falar, portanto, na obtenção do benefício da prisão
domiciliar.
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
Ademais, ressalto que o fato de inexistir na Comarca estabelecimento
adequado para o cumprimento da pena em regime aberto não autoriza a
concessão da prisão domiciliar ao agravante, se o mesmo não preenche os
requisitos previstos no art. 117 da LEP.
Nesse sentido, a jurisprudência deste tribunal:
AGRAVO EM EXECUÇÃO - REMIÇÃO DE PENA - TRABALHO
EXTERNO EM EMPRESA PRIVADA - POSSIBILIDADE - PROGRESSÃO
DE REGIME - REQUISITO TEMPORAL PREENCHIDO - REGIME ABERTO
- INEXISTÊNCIA DE ALBERGUE NA COMARCA - PRISÃO DOMICILIAR -
REQUISITOS DO ART. 117 DA LEP - HIPÓTESE NÃO CONTEMPLADA EM
LEI - IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO. I - Nos termos do art. 126 da
LEP, não há impedimento para que o condenado, que cumpre pena em
regime prisional semi-aberto, preste trabalho externo à empresa privada, não
podendo a interpretação da norma ser realizada em prejuízo ao seu
beneficiário. II- Restando devidamente preenchido pelo sentenciado o lapso
temporal exigido, deve ser mantida a progressão de regime concedida na
decisão agravada. III - A falta de Casa do Albergado na Comarca não
justifica a concessão de prisão domiciliar ao condenado em regime aberto
por ausência de fundamento legal, posto que só terá direito à mesma quando
o caso se enquadrar nas hipóteses expressas no artigo 117 da LEP. ( TJMG
- Agravo nº 1.0000.09.491991-7/001, Rel. Adilson Lamounier, j.
14/07/2009).grifo nosso
EMBARGOS INFRINGENTES - AGRAVO - EXECUÇÃO PENAL -
PRISÃO DOMICILIAR - ART. 117, DA LEP - INTERPRETAÇÃO
RESTRITIVA. O art. 117, da LEP, deve ser interpretado restritivamente, não
podendo cumprir pena em prisão domiciliar senão os condenados que já
estiverem no regime aberto e, cumulativamente, se enquadrarem em
qualquer das hipóteses previstas na lei. ( TJMG -
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
Embargos Infringentes nº 1.0000.08.474005-9/002, Rel. Júlio Cezar
Guttierrez, j. 04/03/2009). Grifo nosso
'HABEAS CORPUS' - CONSTRANGIMENTO ILEGAL - PRESO
CONDENADO - REGIME SEMIABERTO - EXPECTATIVA DE
DISPONIBILIZAÇÃO DE VAGA EM ESTABELECIMENTO PENITENCIÁRIO
ADEQUADO - PRETENSÃO DE CUMPRIMENTO EM PRISÃO DOMICILIAR
- INVIABILIDADE - CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. A
falta de vaga em estabelecimento penal adequado na comarca não permite
que o condenado a quem se impôs o regime semiaberto cumpra a
reprimenda no regime aberto ou em prisão domiciliar, sob pena de supressão
de fases no cumprimento da pena. Na falta de vagas, deve o réu cumprir sua
pena no estabelecimento onde se encontra, no regime a que faz jus e em
cela separada, atendendo às condições impostas pelo Juízo da Execução.
Súmula: DENEGADO O 'HABEAS CORPUS'. Relator: MÁRCIA MILANEZ.
Data do Julgamento: 10/02/2009 Data da Publicação: 09/03/2009
Sendo assim, inviável a concessão da prisão domiciliar, uma vez que,
do contrário, estaríamos invadindo a esfera de atuação do Poder Legislativo,
o que, por óbvio, não é permitido em função dos princípios da autonomia e
separação dos poderes.
Ressalte-se, outrossim, que o agravante deverá cumprir a pena
efetivamente, sendo esta, consequência da prática de ilícito penal, com
caráter aflitivo, e o seu cumprimento deverá ocorrer da mesma forma que
cumprem os demais apenados em situação idêntica.
Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo-se na íntegra
a decisão hostilizada.
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
Custas na forma da lei.
É como voto.
DES. ALEXANDRE VICTOR DE CARVALHO
V O T O
Em que pese os argumentos expendidos, peço vênia ao I. Relator já
que entendo merecer guarida o inconformismo defensivo.
Com efeito, o art. 112 da LEP estabelece que:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva
com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz,
quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime
anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor
do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.
Em relação à prisão domiciliar, reconheço que a matéria é polêmica,
sendo que há diversos julgados admitindo a substituição do regime aberto
pela prisão domiciliar no caso de ausência de estabelecimento adequado.
Colaciono decisão recente do STJ neste sentido:
CRIMINAL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO. PROGRESSÃO AO REGIME
ABERTO.PACIENTE NÃO TRANSFERIDO AO ESTABELECIMENTO
ADEQUADO.CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
DETERMINAÇÃO DE CUMPRIMENTO DA PENA EM REGIME
DOMICILIAR. ORDEM CONCEDIDA. I. É pacífica a jurisprudência desta
Corte no
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
sentido de que, na falta de vagas em estabelecimento compatível ao regime
fixado, configura constrangimento ilegal a submissão do apenado ao
cumprimento de pena em regime mais gravoso, devendo o mesmo cumprir a
reprimenda em regime aberto, ou em prisão domiciliar, na hipótese de
inexistência de estabelecimento adequado.II. Deve ser cassado o acórdão
recorrido para restabelecer a decisão proferida pelo Juízo da Vara das
Execuções Penais de Caxias do Sul, permitindo ao paciente o desconto de
sua reprimenda em prisão domiciliar, até que surja vaga em estabelecimento
adequado ao regime aberto, exceto se por outro motivo estiver preso em
regime mais severo. III. Ordem concedida, nos termos do voto do relator. (HC
198.994/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em
08/11/2011, DJe 17/11/2011)
E por fim, o acórdão nº 310249-6 da então Segunda Câmara Criminal
do Tribunal de Alçada, hoje Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça:
HABEAS CORPUS - EXECUÇÃO PENA - DEFERIMENTO DE
CUMPRIMENTO DE PENA EM REGIME ABERTO - INEXISTÊNCIA DE
CASA DE ALBERGADO OU ALA ESPECIAL NO ESTABELECIMENTO
CARCERÁRIO - PRISÃO DOMICILIAR - ADMISSIBILIDADE - WRIT
CONCEDIDO - Ausente a denominada casa de albergado para a execução
da pena em regime aberto, admite-se a concessão excepcional da prisão
domiciliar, inexistente outro local onde possa a pena ser cumprida com fulcro
nos requisitos da autodisciplina e senso de responsabilidade. - A
acomodação do condenado em regime aberto nas dependências da cadeia
pública onde aguardam julgamento os presos provisórios é inaceitável,
porquanto tal situação enseja um sui generis regime gravoso de execução,
em desacordo com o comando contido na decisão judicial concessiva do
regime mais brando. - Ordem de habeas corpus concedida. (TAMG - HC
0310249-6 - 2ª C.Crim. - J. 30.05.2000)
Vê-se, pois, que a melhor jurisprudência orienta-se no sentido de que,
mesmo reconhecendo que a Lei de Execuções Penais dispõe de forma
exaustiva as hipóteses de cumprimento de pena privativa da
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
liberdade em residência particular - artigo 117 -, é possível o estabelecimento
de prisão domiciliar para os condenados em regime aberto, quando não
houver estabelecimento prisional ou vaga nele próprio para o cumprimento
da pena no regime fixado na condenação definitiva, levando-se em
consideração o grave estado deficitário dos nossos presídios.
É verdade que o Supremo Tribunal Federal, em recentes julgados,
vem entendendo que a prisão domiciliar somente tem cabimento nas
hipóteses exaustivas do art. 117 da Lei de Execução Penal.
Contudo, entendo que a acomodação do sentenciado que deve
cumprir pena em regime aberto nas dependências de uma cadeia pública,
onde estão segregados presos provisórios, é inaceitável, porquanto tal
situação enseja a imposição de um gravame consubstanciado num sui
generis regime de execução, em desacordo com o comando contido na
decisão judicial concessiva do regime mais brando.
Já me manifestei no sentido de que o convívio dos condenados ao
cumprimento de pena em regime aberto com os presos provisórios, ou
mesmo com os condenados em regime fechado ou semi-aberto, não é
salutar, contribuindo para o aumento da população carcerária, em flagrante
ofensa ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (artigo 1º, inciso III,
Constituição Federal).
E nesta oportunidade reitero meu posicionamento no sentido de que
o Estado não pode executar sentença de maneira diferente àquela
determinada na decisão judicial.
O agravado, com direito reconhecido ao regime aberto, não pode
cumprir pena em regime mais gravoso, porque tal situação ofende a garantia
constitucional inserta no inciso XLIX do artigo 5º da Carta Magna, onde a
dignidade do preso é nestes termos assegurada: "é assegurado aos presos o
respeito à integridade física e moral".
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
Assim, seria demasiadamente equivocada a decisão de mantê-lo na
prisão, quando a própria lei oferece alternativa mais coerente com os
princípios constitucionais da dignidade humana e da humanidade das penas
que aqui se prefere à uma interpretação positivista do art. 117 da LEP.
Com essas considerações, DOU PROVIMENTO ao recurso.
É como voto.
DES. SÁLVIO CHAVES
V O T O
Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, também conheço do
recurso.
Data venia, divirjo do eminente Desembargador Relator e acompanho
o voto de divergência do eminente Desembargador 1º Vogal nos termos do
seu voto para dar provimento ao recurso.
É como voto.
SÚMULA: POR MAIORIA, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO,
VENCIDO O DESEMBARGADOR RELATOR.

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